Amplamente utilizadas durante as aulas online durante a pandemia de Covid-19, as câmeras continuam presentes nas salas de aula de várias escolas, especialmente na educação infantil. Especialistas alertam que essa medida de vigilância pode resultar em um "comportamento paranoico" tanto em crianças quanto em professores.
De acordo com a psicóloga Rosa Mariotto, doutora pela Universidade de São Paulo (USP), "Como no livro 1984, de George Orwell, essa vigilância excessiva pode gerar um comportamento paranoico, tira a liberdade tanto das crianças como dos professores."
"Com as câmeras, a sensação é que alguém sempre está de olho, o que tira a espontaneidade, a liberdade corporal e oral das crianças", explica Rosa. Para ela, a escola é o primeiro ambiente em que as crianças pequenas deveriam estar livres do olhar parental. "A escola é teste drive para a vida, onde as crianças aprendem uma série de habilidades sociais."
Essa hipervigilância afeta diretamente o comportamento das crianças, que não se soltam e também não aprendem a viver sem o olhar atento dos pais. "Esse monitoramento leva a dois comportamentos no futuro: cresce e quer fugir ou não sabe se virar sozinho."
Segundo a psicopedagoga Ivone Scatolin, a presença das câmeras nas salas de aula tem um impacto direto no comportamento dos professores. Ela argumenta que os professores se sentem inibidos pela vigilância constante, o que pode afetar negativamente sua capacidade de ensinar. Scatolin ressalta que, embora as câmeras tenham sido fundamentais durante a pandemia, é importante agora fazer uma reflexão sobre sua continuidade.
Tanto Rosa Mariotto quanto Ivone Scatolin concordam que os professores se sentem constantemente sob avaliação e que qualquer erro pode acarretar consequências. Ivone destaca que uma mesma atitude pode ser interpretada de diferentes formas, dependendo de quem está observando, e algo trivial pode se transformar em um problema.
Estamos vivendo um momento de grande confusão, e a escola deveria ser um ambiente confiável. No entanto, o uso dessas câmeras revela desconfiança por parte dos pais em relação à instituição e até mesmo em relação aos seus próprios filhos. Isso gera um clima de vigilância constante e ansiedade para todos os envolvidos, avalia Ivone.
As especialistas sugerem que os pais questionem o impacto dessas câmeras e se ele é positivo ou negativo. Rosa ressalta que muitas escolas utilizam esse tipo de equipamento com objetivos comerciais, em vez de pedagógicos.
"É importante refletir sobre qual é o efeito real dessas câmeras nas salas de aula. Elas são utilizadas em muitos casos como um apelo de marketing, em vez de um recurso pedagógico efetivo", conclui Rosa.
