Em recente decisão, proferida monocraticamente nos autos da ADPF 743, o Ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a União promova as medidas administrativas necessárias à desapropriação, por interesse social, de imóveis atingidos por incêndios dolosos ou desmatamento ilegal, quando a responsabilidade do proprietário esteja devidamente comprovada.
A determinação possui como fundamento o entendimento do Ministro, de que a desapropriação seria possível, em razão de dispositivos legais da Constituição Federal e da Lei de Reforma Agrária autorizarem, e com isso, imóveis onde forem identificados desmatamento ilegal ou incêndio doloso, deverão ser objeto de desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, sob o fundamento de não utilização adequada dos recursos naturais, ou de não cumprimento do dever de preservação do meio ambiente e da função social da propriedade.
Com efeito, o decidido deve preocupar o setor produtivo, pois, embora a decisão determine que a União adote medidas para desapropriar imóveis em caso de incêndios e desmatamentos irregulares, inclusive citando a legislação que trata da reforma agrária, não há no âmbito administrativo ou legal, a regulamentação desse procedimento, com estabelecimento de parâmetros, forma de exercício de contraditório e ampla defesa, tampouco uma ordem de gradação de sanções, o que tende a gerar grande insegurança no setor do agronegócio, na medida em que a questão não está delineada de maneira clara e espera-se seja submetida aos primados da proporcionalidade e da razoabilidade.
Com efeito, a decisão não responde importantes indagações, a saber: qualquer desmatamento irregular ou queimada gerará a desapropriação? Haverá uma gradação de sanções a serem aplicadas, ou qualquer ilícito dessa natureza conduzirá a desapropriação? Caso exista a queimada ou desmatamento irregular de uma área da propriedade rural, a desapropriação será de todo o imóvel? Quem será responsável por conduzir o procedimento administrativo para apuração da infração ambiental e desapropriação do imóvel? A decisão se aplicará para fatos já consumados ou somente para os futuros?
São perguntas que não estão respondidas na decisão do STF e que impactam diretamente na forma como a União deverá conduzir estes casos, além de se evidenciar que propriedades rurais localizadas na Amazônia e no Pantanal, que são os biomas objeto da ADPF 743, possuem grande restrição à intervenções humanas, com limites severos para o exercício de atividade econômica, além de dificuldade de acesso, situação que inclusive prejudica a desapropriação para fins de reforma agrária, e caso isso ocorra, deverá ocorrer um aumento dos danos ambientais, ao invés da redução, decorrentes do crescimento populacional nessas regiões, e necessária diversificação da atividade produtiva, já que à exemplo do Pantanal, atualmente a atividade pecuária predomina e existe vedação ao plantio e cultivo de culturas.
Todavia, embora a decisão do STF não tenha esclarecido importantes pontos, fato que gera grande insegurança, até que todas as questões sejam esclarecidas, é relevante que Produtores Rurais com propriedades no Pantanal fiquem atentos a essa decisão do STF, e somente realizem queimada controlada, devidamente autorizada pelo órgão ambiental competente, assim como não realize intervenções ambientais sem o devido licenciamento, quando a legislação assim exigir, pois não está claro o tratamento dado nas hipóteses de transgressão, que poderão sair da esfera de sanção administrativa e obrigação de recomposição ambiental, para a desapropriação da propriedade.
Em havendo qualquer infração ambiental, especialmente decorrentes de queimada ou desmatamento, recomenda-se que o Produtor Rural procure um advogado, para realizar a defesa no âmbito administrativo e avaliar os riscos decorrentes de eventual sanção administrativa e desdobramentos.
Douglas de Oliveira, é Advogado, Doutor e Mestre em Direito, Sócio do Escritório OVA Advogados.